Gloria Alvarez: Entender para promover
Chama a atenção o poder do discurso dessa mulher de 33 anos, Gloria Alvarez, cientista política da Guatemala em uma conferência na Espanha que viralizou na internet e alcançou milhões de visualizações no YouTube. Embora o discurso tenha sido feito em setembro de 2014, no Parlamento Iberoamericano da Juventude, em Zaragoza, foi em março de 2015 que ele se espalhou rapidamente pelas redes.
Veja agora o discurso de Gloria Álvarez para a União Européia na 1ª Cúpula Anual do Parlamento Europeu sobre “Liberdade Econômica” entre 11 e 12 de abril de 2018.
Ao assistir a irreverência e domínio de cena – como se vê na arte do artista -, ela impressiona também por suas ideias e posturas políticas ‘libertaristas’, mobilizando plateias reais e virtuais com frases como a do jornalista e escritor argentino Mariano Grondona: “El populismo ama tanto a los pobres que los multiplica”. Contra o avanço dos líderes populistas, ela recomenda o uso da internet para compartilhar informação e a promoção de argumentos lógicos e racionais no debate público.
O buraco é mais em baixo
O artigo publicado pela Agência Pública conta não apenas sua história, como descreve datas, nomes e fatos que, segundo o jornalista investigativo Martín Rodríguez Pellecer, diretor do site guatemalteco Nómada, parceiro da Pública, a jovem líder do Movimento Cívico Nacional (MCN), não representa nada exatamente novo. “A grande diferença é a linguagem. O MCN recebe fundos de algumas das maiores empresas da elite empresarial tradicional, entre elas, a Azúcar de Guatemala, um cartel poderosíssimo de treze empresas (a Guatemala é o quarto maior exportador mundial de açúcar) e as usinas guatemaltecas têm, inclusive, investimentos em usinas no Brasil.”
O artigo merece ser lido e não diminui o brilho, a liderança e a impetuosidade dessa jovem promissora que se expressa como candidata às futuras eleições presidenciais. Da Guatemala?
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O uso da internet para compartilhar informação e a promoção de argumentos lógicos e racionais no debate público é, sem dúvida alguma, um poderoso veículo ao alcance de 3,2 bilhões de vozes e mãos. No entanto, é necessário entender antes de promover ideias e ideais. É importante que os argumentos sejam lógicos e racionais, antes de se içar bandeira em prol de uma verdade única.
Assim nos ensina a lenda Yorubá
Conta uma tradição oral de matriz africana que no principio havia uma única verdade no mundo. Entre o Orun (mundo invisível, espiritual) e o Aiyê (mundo natural) existia um grande espelho. Assim tudo que estava no Orun se materializava e se mostrava no Aiyê. Ou seja, tudo que estava no mundo espiritual se refletia exatamente no mundo material. Ninguém tinha a menor dúvida em considerar todos os acontecimentos como verdades. E todo cuidado era pouco para não se quebrar o espelho da Verdade, que ficava bem perto do Orun e bem perto do Aiyê.
Neste tempo, vivia no Aiyê uma jovem chamava Mahura, que trabalhava muito, ajudando sua mãe. Ela passava dias inteiros a pilar inhame. Um dia, inadvertidamente, perdendo o controle do movimento ritmado que repetia sem parar, a mão do pilão tocou forte no espelho, que se espatifou pelo mundo. Mahura correu desesperada para se desculpar com Olorum (o Deus Supremo).
Qual não foi a surpresa da jovem quando encontrou Olorum calmamente deitado à sombra de um iroko (planta sagrada, guardiã dos terreiros). Olorum ouviu as desculpas de Mahura com toda a atenção, e declarou que, devido à quebra do espelho, a partir daquele dia não existiria mais uma verdade única.
E concluiu Olorum: “De hoje em diante, quem encontrar um pedaço de espelho em qualquer parte do mundo já pode saber que está encontrando apenas uma parte da verdade, porque o espelho espelha sempre a imagem do lugar onde ele se encontra”. Portanto, para seguirmos a vontade do Criador, é preciso, antes de tudo, aceitar que somos todos iguais, apesar de nossas diferenças. E que a Verdade não pertence a ninguém. Há um pedacinho dela em cada lugar, em cada crença, dentro de cada um de nós.
Por Maria Alice Guedes